A recente movimentação no Supremo Tribunal Federal (STF) traz novos desdobramentos para a correção do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). O partido Solidariedade protocolou um pedido para que a decisão sobre a correção do FGTS pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) tenha efeitos retroativos, o que pode trazer impactos significativos para trabalhadores e para a economia do país. Neste artigo, vamos entender os detalhes dessa proposta, o que está em jogo e como isso pode afetar o saldo dos trabalhadores.
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O que é a correção do fgts?
O FGTS é um fundo destinado a proteger o trabalhador em situações de demissão sem justa causa, aposentadoria, compra de casa própria, entre outras circunstâncias. Ele é formado por depósitos mensais realizados pelo empregador, no valor correspondente a 8% do salário do funcionário. Esses valores ficam depositados em uma conta na Caixa Econômica Federal, rendendo a uma taxa de 3% ao ano, acrescida da Taxa Referencial (TR).
No entanto, a TR vem sofrendo críticas há anos, pois ela não acompanha a inflação, o que resulta em perdas reais para os trabalhadores. Desde a criação do FGTS em 1966, os rendimentos ficaram muito aquém da inflação, corroendo o poder de compra dos valores depositados no fundo.
Qual é a mudança proposta?
O Solidariedade, por meio de “embargos de declaração”, pediu ao STF que a decisão sobre a correção do FGTS pelo IPCA tenha efeitos retroativos. Esse tipo de recurso é utilizado para esclarecer eventuais omissões ou contradições nas decisões judiciais. A legenda argumenta que os trabalhadores que ingressaram com ações na justiça, buscando a correção de seus saldos pela inflação, tinham a expectativa legítima de que essa nova correção seria aplicada de forma retroativa, garantindo que suas perdas fossem recuperadas.
Essa expectativa está baseada no fato de que, historicamente, a jurisprudência da Corte costuma garantir a retroatividade quando uma decisão importante é tomada. No entanto, a modulação dos efeitos — mecanismo utilizado para limitar a eficácia de uma decisão judicial apenas para o futuro — tem sido aplicada em alguns casos, como forma de evitar impactos financeiros bruscos sobre o Estado.
O que é a modulação de efeitos?
A modulação de efeitos é um instrumento jurídico que o STF utiliza para definir os impactos temporais de suas decisões. Basicamente, a Corte pode decidir se uma nova interpretação ou decisão se aplica retroativamente ou apenas a partir de um ponto específico no tempo, evitando efeitos retroativos em determinadas situações.
No caso do FGTS, a modulação de efeitos poderia limitar a aplicação da nova correção pelo IPCA apenas para o futuro, evitando o impacto de bilhões de reais nos cofres públicos, caso as perdas dos trabalhadores desde 1999 fossem corrigidas. Estima-se que essa retroatividade poderia gerar um impacto financeiro de R$ 295 bilhões, segundo a Advocacia-Geral da União (AGU).
O impacto econômico da revisão do fgts
Caso o STF decida aplicar a correção retroativamente, o impacto financeiro seria enorme. Trabalhadores que tiveram seus saldos do FGTS corrigidos apenas pela TR, acumulando perdas ao longo dos anos, teriam direito a uma restituição significativa, o que poderia representar um alívio financeiro para milhões de brasileiros. No entanto, isso também geraria um grande ônus para o Estado, que teria que desembolsar bilhões de reais para arcar com essa correção.
Por outro lado, se a decisão permanecer sem efeitos retroativos, apenas os depósitos futuros seriam corrigidos pela inflação, limitando o impacto financeiro imediato, mas mantendo as perdas históricas dos trabalhadores.
O papel do conselho curador do fgts
Outro ponto levantado pelo Solidariedade é o papel do Conselho Curador do FGTS. Esse órgão tem a função de gerir os recursos do fundo e garantir sua viabilidade para o financiamento de políticas públicas, como habitação, saneamento e infraestrutura. O partido critica o fato de que o conselho seria responsável por determinar como compensar a defasagem inflacionária, alegando que isso distorce sua função original e pode gerar instabilidade econômica para os trabalhadores.
A ideia de que o conselho tome decisões sobre compensações inflacionárias preocupa, pois isso pode comprometer a sustentabilidade do fundo, que é essencial para a execução de políticas públicas fundamentais no Brasil. Qualquer mudança drástica pode impactar recursos que seriam destinados a esses projetos, prejudicando tanto os trabalhadores quanto a sociedade em geral.
O que pode acontecer daqui para frente?
O STF já tomou uma decisão parcial em junho deste ano, determinando que os saldos do FGTS devem, ao menos, repor a inflação, corrigindo os valores depositados com base no IPCA. Essa decisão foi fruto de negociações entre a AGU e as centrais sindicais, que buscaram uma solução intermediária que não comprometa demasiadamente os cofres públicos.
No entanto, a decisão sobre a retroatividade ainda está em aberto, e o embate jurídico continua. O STF pode decidir aplicar os efeitos retroativamente, beneficiando trabalhadores que ingressaram com ações judiciais no passado, ou pode manter a modulação de efeitos, limitando os impactos da decisão para o futuro.
Possível solução administrativa
Uma das propostas levantadas durante o processo foi a resolução das perdas passadas de forma administrativa, através de um depósito extraordinário de valores do FGTS nas contas dos trabalhadores. No entanto, essa sugestão feita pela AGU não foi aceita pela Corte. Isso significa que, se houver retroatividade, o impacto será diretamente nas contas do governo, que terá que arcar com as correções inflacionárias de anos anteriores.
Como os trabalhadores podem se preparar?
Enquanto o STF não define a questão, os trabalhadores que entraram com ações judiciais questionando a correção do FGTS pela TR devem ficar atentos às movimentações do processo. Caso a decisão seja favorável à retroatividade, esses trabalhadores poderão receber valores adicionais referentes às correções inflacionárias.
Além disso, aqueles que ainda não ingressaram com ações podem buscar orientação jurídica para verificar se ainda há possibilidade de contestar a correção do FGTS. Vale lembrar que, em caso de decisão favorável, é possível que novos processos sejam abertos, caso a Corte não limite os efeitos da decisão apenas para o futuro.
Considerações finais
A decisão do STF sobre a correção do FGTS é aguardada com grande expectativa por milhões de trabalhadores brasileiros. A possibilidade de uma correção retroativa poderia representar uma importante recuperação de perdas financeiras, mas, ao mesmo tempo, gera preocupações sobre o impacto econômico para o Estado. Seja qual for o desfecho, é fundamental que os trabalhadores estejam bem informados sobre seus direitos e as possíveis consequências dessa decisão.
Imagem: Eliseu Geisler / Shutterstock