Com o avanço das tecnologias e a digitalização das finanças, o celular se tornou uma verdadeira carteira eletrônica. Aplicativos bancários, PIX, senhas salvas e acesso direto às contas tornaram o smartphone uma peça-chave na vida financeira dos brasileiros. No entanto, essa comodidade vem acompanhada de um risco crescente: o uso indevido do aparelho por criminosos para aplicar golpes.
Diante dessa realidade, surge uma dúvida recorrente: os bancos devem ressarcir os valores roubados quando um cliente tem o celular furtado ou assaltado? Especialistas em direito do consumidor, decisões judiciais e entidades de defesa indicam que sim, os bancos são responsáveis nesses casos. Entenda por quê.
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O que diz o Código de Defesa do Consumidor?
Responsabilidade objetiva das instituições financeiras
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), os bancos têm responsabilidade objetiva sobre falhas na prestação de serviços. Isso significa que não é necessário provar culpa, apenas o dano e o nexo entre o serviço e o prejuízo. Em casos de transações indevidas após roubos de celular, essa responsabilização se aplica quando há falhas de segurança ou ausência de medidas eficazes de proteção ao cliente.
Notificação imediata ao banco é essencial
Ainda segundo o CDC, o consumidor deve notificar a instituição financeira assim que perceber movimentações suspeitas ou o roubo do celular. Embora o ideal seja fazer isso o mais rápido possível, entidades como o Procon-SP defendem que a responsabilidade do banco permanece mesmo após uma comunicação tardia, se for comprovado que houve negligência ou falha sistêmica.
Quadrilhas especializadas aumentam prejuízos
Como atuam os criminosos?
Segundo o Procon-SP, diversas quadrilhas estão se especializando no roubo de celulares com foco específico no acesso a aplicativos bancários. Ao obter os aparelhos, os criminosos utilizam técnicas como engenharia social, sim swaps e restauração de senhas para driblar as proteções dos apps.
Essas ações resultam em prejuízos altos para as vítimas, com transações que incluem empréstimos fraudulentos, PIX para contas de terceiros e transferências de valores expressivos.
Casos julgados: a Justiça tem favorecido as vítimas
Decisão do TJ-SP reforça dever dos bancos
Em um caso emblemático, a 12ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um banco a devolver R$ 30 mil a uma cliente que teve o celular roubado. O dispositivo foi usado para realizar transações bancárias indevidas, mesmo após a tentativa de bloqueio do aplicativo.
Argumentos rejeitados pela Justiça
O banco alegou culpa exclusiva da vítima, sugerindo negligência ao proteger o aparelho. No entanto, os desembargadores não aceitaram a justificativa. A sentença foi baseada na Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determina:
“As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”
Especialistas defendem mais segurança nos aplicativos
Medidas de proteção ainda são insuficientes
O advogado Alexandre Berthe Pinto, que atuou em casos semelhantes, defende que os bancos devem reforçar seus mecanismos de autenticação e investir em soluções de segurança cibernética que realmente protejam os clientes — principalmente no ambiente mobile.
“É inadmissível que, em pleno 2025, os aplicativos bancários ainda permitam movimentações financeiras de alto valor apenas com biometria ou senha previamente salva no aparelho”, afirma o especialista.
O que fazer em caso de roubo de celular com transações bancárias?
Passo a passo para minimizar prejuízos
- Comunique imediatamente o banco: Use canais como SAC, app ou central de atendimento.
- Bloqueie o chip e o aparelho: Entre em contato com a operadora e peça o bloqueio do número e do IMEI.
- Registre boletim de ocorrência (BO): Isso ajuda na formalização da denúncia e pode ser feito online em vários estados.
- Guarde todos os comprovantes de comunicação com o banco: Eles servirão de prova em caso de processo judicial.
- Procure o Procon ou um advogado especializado: Caso o banco negue o ressarcimento.
Quando o banco pode se recusar a ressarcir?
Exceções previstas em lei
Embora a regra seja a responsabilidade objetiva, existem casos em que os bancos podem tentar se isentar da culpa, especialmente quando:
- Há evidências de fraude interna ou envolvimento da vítima;
- O cliente compartilhou senhas ou acessos com terceiros;
- A transação foi feita em ambiente considerado seguro e com múltiplas camadas de autenticação.
Nesses casos, o ônus da prova recai sobre a instituição financeira, que deve demonstrar que não houve falha no sistema.
Como prevenir fraudes após roubo do celular?
Dicas práticas de segurança digital
- Nunca salve senhas nos navegadores ou apps;
- Desative o acesso automático a aplicativos bancários;
- Use senhas diferentes para cada aplicativo;
- Ative a função “apagar dados remotamente” no seu aparelho;
- Habilite autenticação em duas etapas (2FA) sempre que possível;
- Use apps de cofres digitais para guardar dados sensíveis.
O que esperar do futuro? Tendência é mais segurança e mais ações judiciais
Com o aumento dos casos e o fortalecimento de decisões judiciais favoráveis às vítimas, a tendência é que os bancos aprimorem seus sistemas de segurança e consumidores fiquem mais conscientes de seus direitos.
Além disso, órgãos como o Banco Central e o Procon devem pressionar as instituições financeiras para reforçarem as camadas de proteção e ampliarem os canais de atendimento emergencial.
Considerações finais
A era digital trouxe conveniência, mas também desafios inéditos para a segurança financeira. O uso massivo dos aplicativos bancários exige que as instituições financeiras assumam sua parcela de responsabilidade diante dos riscos envolvidos.
Se você foi vítima de roubo de celular e sofreu prejuízos com transações indevidas, não aceite a negativa do banco sem contestação. Os tribunais brasileiros têm reconhecido o dever das instituições de ressarcir e proteger seus clientes, principalmente quando há falha sistêmica ou ausência de protocolos eficazes.
Imagem: Donenko Oleksii / shutterstock.com